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Integrante da Abrasco lista os possíveis retrocessos da aprovação do projeto de lei que flexibiliza

  • Por André Antunes – EPSJV/Fiocruz
  • 15 de mai. de 2018
  • 11 min de leitura







É importante colocar que a palavra “defensivo” já vem sendo utilizado pelo setor há muito tempo, desconsiderando a palavra “agrotóxico”. A gente sempre se baseou na lei para se referir ao agrotóxico, e o que eles querem com esse projeto é mudar para “defensivo fitossanitário”. Nossa preocupação é que essa medida tenha consequências de ocultar a toxicidade dos produtos. Será que todos os brasileiros que estão lá nas regiões mais distantes e sem informação que estão acompanhando as questões relativas ao agrotóxico, que eles sabem que é veneno, sabem que vai virar defensivo fitossanitário? De repente vai entrar um produto para eles com esse nome e ele vai achar que é inócuo. Então, essa questão da mudança do nome é um problema. E isso não é um movimento isolado. Para você ter uma ideia, a Anvisa tem diretrizes internas baseadas em uma Portaria publicada em 1993 – anterior portanto à criação da própria Agência -, que está sendo revisada agora, ao mesmo tempo que PL do veneno está sendo votado.








Não demonizando a Anvisa nem o Ibama, a estrutura que eles têm para avaliar os milhares de produtos que estão na fila de registros é muito precária. São poucos técnicos. Tem que se investir nesses órgãos. O pedido de registro é feito mediante o pagamento de uma taxa irrisória no Brasil, enquanto em outros países as indústrias têm que pagar um preço bem mais elevado. Isso poderia, por exemplo, ser reaplicado na estrutura do órgão e na contratação de servidores, realização de concursos, etc. A Anvisa como um todo é uma agência que trata de medicamentos, de cosméticos, de agrotóxicos. Uma boa parte do PIB brasileiro é regulada pela Anvisa, então é um órgão que tem que ser muito bem equipado, capacitado, estruturado. Tanto a Anvisa quanto o Ibama. Então, a gente tem que estar atento a esse discurso de que demora muito tempo o registro porque não é simplesmente tirando o órgão dessa função que vai resolver.




Bom, aí a gente tem uma grande limitação. Vamos considerar que a indústria tenha feito um estudo com muita honestidade. Mesmo assim eles são limitados. Primeiro porque o animal de laboratório está isolado ali de uma forma em que ele só recebe aquele agrotóxico. Ou seja, é uma condição muito artificial, muito diferente da nossa exposição, da exposição do trabalhador rural, que tem outros fatores que podem interagir na toxicidade, no efeito tóxico do agrotóxico: a radiação solar, jornadas extensivas de trabalho, o próprio estresse da pressão econômica da safra, do preço da safra do local de venda, o clima. Isso causa condições de estresse. E ele está exposto a mais de um agrotóxico, na sua vida, na aplicação. Ele vai aplicar às vezes um inseticida e um fungicida ao mesmo tempo, porque isso é legal. E aí como é que essas substâncias químicas interagem? A gente sabe que tem vários medicamentos, por exemplo, que não se pode tomar junto porque vão causar problemas, você não pode associar um medicamento com álcool, com fumo etc. Então, esses estudos de laboratório já são limitados por isso.




Já é problemática. A Anvisa também não é a pior agência do mundo. Isso ocorre na Europa, nos Estados Unidos, só que lá eles estão caminhando no sentido de restringir os produtos que podem causar essa interação. A Europa principalmente tem vários produtos proibidos que são permitidos no Brasil. A gente fez um estudo na Unirio que levantou que temos mais ou menos 470 ingredientes ativos de agrotóxicos registrados no Brasil, dos quais 150 são proibidos na Europa. Ou seja, o que eles têm que nós não temos? Primeiro, que eles têm uma revisão periódica de registro a cada 15 anos. Eles renovam o registro do agrotóxico depois de uma reavaliação dos estudos dos efeitos e isso nós não temos no Brasil. Quando a Anvisa quer reavaliar um agrotóxico ela tem que apresentar uma série de justificativas, as indústrias entram na justiça, o setor do agronegócio também e ela não consegue finalizar isso.


Sim. É o caso do glifosato que ela não terminou, e do Paraquat, que acho que é o caso mais crítico. Porque o glifosato ainda é permitido no mundo inteiro. Ele quase foi proibido na Europa, mas as empresas fizeram muita pressão e ele continua sendo permitido. Mas qual a diferença? A Europa usa volumes muito menores. A Europa não planta transgênicos, só em pequenas regiões da Espanha. O glifosato é mais usado nas lavouras transgênicas, e o Brasil está em segundo lugar em termos de áreas plantadas com transgênicos, atrás apenas dos Estados Unidos. Os transgênicos, a maior parte deles, são plantas resistentes ao glifosato. Então, o que acontece? Eles plantam essa soja ou milho transgênico, e podem pulverizar glifosato à vontade que todas as outras plantas morrem e só sobrevive aquela soja ou aquele milho transgênico. Se não tem isso na Europa, onde quase não tem plantio transgênico, o volume de glifosato utilizado lá é muito menor. Portanto, mesmo a Europa permitindo o glifosato, são condições de plantio muito diferentes. Esse dado é importante porque o projeto de lei 6299/02 aponta ainda a possibilidade de permitir o registro temporário de agrotóxicos. Ou seja, se o registro no Brasil, essa avaliação desses dossiês toxicológicos, levar mais de um ano, eles vão permitir o registro temporário de um agrotóxico sem o aval dos órgãos internos de saúde e meio ambiente, sem nem a consulta a eles, se tiver sido aprovado em outro país da OCDE.





O que acontece, como eu falei anteriormente, é que, nos testes, o animal de laboratório só está exposto ao ingrediente ativo na sua forma mais pura, diluído em água, mas ele recebe esse agrotóxico na sua forma mais pura. Quando ele é produzido, quando chega lá na embalagem, ele é misturado a outras substâncias que vão ajudar, por exemplo, a espalhar o agrotóxico ou a manter o agrotóxico ali retido na planta, na folha ou no solo. Essas substâncias são os adjuvantes, que vão atuar na função do agrotóxico. Tem substâncias que são chamadas de sinergistas, que vão ajudar a tornar aquela substância mais tóxica. Então, por exemplo, nos inseticidas a base de piretróide, já vinha sendo utilizado, e outros países já proibiram, uma substância chamada piperonil butoxido, que não é um agrotóxico, é uma substância sinergista para ajudar a aumentar o potencial inseticida dos piretroides. Se ele aumenta o efeito tóxico para o inseto, qual é o efeito que vai causar para o ser humano? Provavelmente também é maior. Só que eles não são estudados, não são testados nesses animais de laboratório. Eles simplesmente avaliam a toxicidade do ingrediente ativo de agrotóxico. Existem estudos que avaliam a toxicidade desses adjuvantes, mas também de forma isolada. Só que quando junta tudo isso no produto da prateleira, eles não são testados.



Outra questão importante que o PL prevê é sobre os estudos de monitoramento de resíduos de agrotóxicos em alimentos. Determina que, mesmo que um órgão de saúde faça as análises, como a Anvisa vem fazendo, quem seria o responsável pela divulgação seria o setor da agricultura. Como vai ser essa divulgação? Vão divulgar só os bons resultados? Isso é uma questão crítica também que atinge o direito à informação de uma forma muito forte. A Anvisa faz anualmente o Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos em Alimentos (PARA), que está inclusive um pouco parado nos últimos dois anos, mas o que esse PL prevê também é que só quem pode divulgar seria o Ministério da Agricultura. Isso é muito complicado. E a outra questão que também é complicada é que os municípios e os estados deixariam de poder legislar de forma mais restritiva. Isso é muito importante porque os municípios ou estados podem legislar de acordo com o tipo de agricultura que têm, de acordo com a estrutura, por exemplo, de SUS ou de fiscalização que teriam para atender esse problema. E com a aprovação do PL, se um produto é permitido no Brasil, ele seria obrigatoriamente permitido em todos os estados.



 
 
 

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